BNDES e setor elétrico estudam novas formas de financiamento

21/03/2018

BNDES e setor elétrico estudam novas formas de financiamento
Valor Econômico

Por Daniel Rittner

O fortalecimento do mercado secundário de debêntures e a securitização de recebíveis em empréstimos de longo prazo despontam como novas alternativas de financiamento do setor elétrico. São mecanismos que permitem alocar mais recursos para os segmentos de geração, transmissão e distribuição de energia - todos atividades de capital intensivo - em um cenário de restrições dos agentes públicos de crédito.

As duas medidas são indicadas em um estudo inédito do Instituto Acende Brasil e fazem parte do recémaprovado planejamento estratégico do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que tem pela frente o desafio de continuar sendo um ator relevante na concessão de empréstimos para grandes projetos de infraestrutura, mesmo sem esbanjar o dinheiro que já teve no passado.

Em 2016, a nova política de atuação do BNDES reduziu de 7 0% para 50% sua participação máxima no financiamento de grandes hidrelétricas. Usinas com alto índice de emissão de poluentes, como térmicas a carvão e a óleo, deixaram de ser financiadas pelo banco. Linhas de transmissão podem receber até 80% de crédito, mas a taxas de mercado e sob condições rigorosas. O índice de cobertura do serviço da dívida (ICSD) é de 1,5 - ou seja, os empreendedores precisam ter fluxo de caixa de uma vez e meia o valor da parcela a ser paga, o que na prática limita o volume de créditos solicitados.

Diante disso, o "white paper"do Instituto Acende Brasil explora opções de financiamento para os investimentos no setor elétrico e aponta essas inovações no mercado de capitais como saída.

"Um dos fatores que dificulta o financiamento da infraestrutura é a baixa liquidez dos seus valores mobiliários, como as debêntures. Essa dificuldade poderia ser mitigada se houvesse um mercado com alta liquidez", afirma o estudo do instituto, que será divulgado nos próximos dias.

O presidente do Acende Brasil, Cláudio Sales, lembra que desde 2011 os investidores pessoa física têm isenção de Imposto de Renda (IR) para a compra de debêntures incentivadas de infraestrutura. O benefício é dado a projetos enquadrados pelos ministérios setoriais, como o de Minas e Energia. No entanto, poucos se arriscam a adquirir um papel com seis, oito ou mais anos de duração - já que a falta de um mercado secundário forte praticamente impede o resgate antecipado. Fosse diferente, ocorreria como um título do Tesouro Direto, que pode ter data de 2022 ou 2025, por exemplo, mas com revenda possível a qualquer hora.

A sugestão mais simples do instituto para desenvolver um mercado secundário é estender os benefícios tributários das debêntures de infraestrutura para investidores institucionais (assim amplia-se a participação de agentes como fundos de pensão e bancos). Mas também pede que esses papéis possam ser usados como garantia nas câmaras de compensação. A B3 aceita que os depósitos de garantia tomem a forma de 13 títulos (CDBs, ADRs, ouro, Letras de Crédito Imobiliário (LCI), ações, títulos do governo federal negociados no Brasil, entre outros), mas não aceita as debêntures incentivadas de infraestrutura.

As inovações recomendadas pelo Acende Brasil estão em sintonia com o plano estratégico aprovado pelo BNDES, há menos de duas semanas, para o período de 2018 a 2035. Uma das ideias é a atuação do banco como "market maker"para debêntures, diz o diretor da área de crédito, tecnologia e planejamento, Carlos da Costa. O "formador de mercado"é um agente contratado para assegurar as ofertas de compra e venda de um determinado ativo, de forma regular e contínua, provendo assim tanto liquidez quanto frequência mínima de cotações de preço do ativo para o mercado.

Outra frente estudada pelo BNDES é a securitização de recebíveis. Costa lembra que o momento mais crítico de projetos de infraestrutura em geral são os primeiros anos, quando o empreendedor normalmente está voltado à construção ou modernização das instalações. Depois de alguns anos, quanto o ativo entra em funcionamento, passa a ter receitas regulares e praticamente garantidas. Em vez de receber os valores emprestados de forma paulatina, até o fim do contrato de concessão, o banco de fomento pode antecipar esses montantes em uma operação de mercado e reemprestar o dinheiro para outros investidores.

"Não é algo para se fazer imediatamente", pondera Costa, enfatizando que o modelo serve não apenas para o setor elétrico, mas para a infraestrutura em geral. "À medida que o mercado secundário for amadurecendo, faz todo sentido girar a nossa carteira [de crédito]. Até para termos a capacidade de financiar mais projetos, sem precisar de novos recursos", acrescenta o diretor da instituição. Quanto mais perto de expirar o empréstimo original do BNDES, na reta final do contrato de concessão, mais valor ele teria como produto no
mercado e mais fácil montar a operação.

O estudo do Acende Brasil vai na mesma linha: "Os financiamentos continuariam sendo concedidos em contratos de longo prazo, mas, uma vez superada a fase crítica de implantação do empreendimento, esses provedores de crédito oficiais promoveriam a securitização dos seus recebíveis. Com isso, antecipariam o recebimento de seus recursos, liberando-os para financiar novos projetos".

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